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Mostrando postagens de janeiro, 2021

Retirada

A melhor forma de desistir de algo ou alguém que você já comprovou que não vale mais qualquer investimento, é fazê-lo apenas dentro de você no mais absoluto silêncio; sem gastar um segundo a mais de energia com o que não te merece. Artwork: Saeed Razzaghi

Entre costuras

(...) Sim, havia uma falta invisível, mas ao mesmo tempo real e robusta Não cessava, entrava por todos os intervalos e pausas, fazia-se lembrar Mas desta vez nada a abrandava, tornara-se incapaz de ser domada, enganada Esgotara as lembranças bordadas de coloridas ilusões, interpretações complacentes Agora existiam apenas dias, horas e preguiçosos minutos incapazes de serem ludibriados Joana então passou a viver um diário sem poesia, talvez um deserto necessário para florescer Artwork:  Agnes Cecile

Azul

Miguel tinha uma personalidade evanescente. Não se detinha em absolutamente nada, talvez nem mesmo em si próprio. Vivia sob a rigidez de uma fórmula construída ao longo das suas ainda poucas décadas, para não ter que lidar com nada que fizesse a menor marola no seu autocontrole.  Assim, ele podia ficar com sua jangada plantada em alto mar sem ir a lugar algum por tempo indeterminado. Ele não nadava, não mergulhava, talvez nunca tenha chegado sequer a molhar-se de fato, mesmo estando no meio do oceano. Miguel não se importava com a monotonia daquele céu sempre igual, nem com aquela vastidão de águas inalterável, desde que ele permanecesse exatamente no mesmo lugar.  Seu quadrado no mundo era um quadro monocromático e estático com um horizonte de linhas bem definidas e inflexíveis, onde nenhum elemento escapava ou surpreendia, apenas reafirmava  ad aeternum um estado de coisas inabalável ou, em outra leitura, |paralisado|. Artwork:Katherine Gendreau

Anáguas

Não, Joana não gostava de ficar sozinha ou de se afastar das pessoas.  Joana era naturalmente alegre e carinhosa, gostava de correr pelos campos descalça, se jogava sem medo na grama, era capaz de entrar de roupa no mar, não fugia da chuva — se deixava molhar até encharcar-se... Mas, Joana finalmente se deu conta de que sua sensibilidade tinha muitas anáguas e de que ela nunca mais permitiria que alguém pisasse nelas. Photo: Laura Hanifin

Futuro

Ela poderia ter gritado impropérios, mas tudo o que conseguiu dizer foi: — Espero que você encontre borboletas, em você... E partiu, cabelos ao vento, todos eles. Artwork: Fabienne Jenny Jacquet